Erro de tipo

Conceitualmente, distingue-se erro e ignorância: erro é a falsa representação da realidade, ou o equivocado conhecimento de um elemento, enquanto a ignorância é o desconhecimento da realidade. Esta distinção é apenas conceitual, pois são tratados de maneira equiparada.

Há duas classificações do erro de tipo: erro de tipo essencial e erro de tipo acidental, cada uma com características e consequências diversas.

Erro de tipo essencial

O erro de tipo essencial é a falsa percepção da realidade que recai sobre elementos, circunstâncias, justificantes ou qualquer característica de uma determinada figura típica. Divide-se em erro sobre elementar e erro sobre descriminante.

Erro sobre elementar

O erro, neste caso, recai sobre as elementares do tipo, ou seja, sobre os dados essenciais da figura típica, sem os quais ela não subsiste.

Art. 121. Matar alguém.

Neste caso, excluindo-se o “matar”, o tipo perde um de seus dados essenciais, e não mais se configura um homicídio. O mesmo acontece se for excluído o “alguém”.

O erro de tipo sobre elementar ocorre quando, por equivocada percepção da realidade, o agente não sabe que realiza as características elementares de um tipo.

O agente, um professor universitário, tem o costume de, durante todas as suas aulas, deixar seu celular sobre a mesa e pegá-lo de volta no final da aula. Um dia, pega equivocadamente o celular de um aluno, que ali o deixara, pensando de tratar do seu.

Art. 155. Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel.

Neste caso, o agente tem noção de que está pegando coisa móvel, porém, não sabe que se trata de coisa alheia, que é elementar do tipo.

A consequência deste tipo de erro é a exclusão do dolo, visto que o dolo é consciência e vontade, aspectos que estão ausentes neste tipo de erro. Entretanto, o erro de tipo sobre elementar pode ser inevitável ou evitável.

O erro inevitável ou escusável é aquele que o cuidado comum não seria capaz de evitar e, portanto, não houve culpa (quebra de dever de cuidado). Como consequência, o erro de tipo sobre elementar, quando escusável, afasta também a culpa e torna o fato atípico.

O erro evitável ou inescusável é aquele que o cuidado comum poderia evitar, ou seja, houve descuido do agente e, por conseguinte, culpa. Assim sendo, o erro inescusável permite a punição por culpa, mas apenas se previsto em lei, pois nem todo crime é punível na forma culpável.

Art. 20. O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime e exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.

Erro sobre descriminante

Descriminante é sinônimo de excludente de antijuridicidade (previstas no art. 23 do CP, são: legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito), logo, erro de tipo sobre descriminante é o mesmo que erro sobre excludente de antijuridicidade e descriminante putativa.

ERRO SOBRE DESCRIMINANTE = ERRO SOBRE EXCLUDENTE DE ANTIJURIDICIDADE = DESCRIMINANTE PUTATIVA

Neste caso, por equivocada compreensão da situação fática, o agente imagina estar em circunstâncias que, se fossem reais, tornariam sua conduta acobertada por uma excludente de antijuridicidade.

Este tipo de erro tem as mesmas consequências que as do erro sobre elementar, logo, o dolo será sempre excluído. Se o erro for inevitável, exclui-se também a culpa. Caso seja evitável, permite-se a punição por culpa, se previsto em lei.

Erro de tipo acidental

Este tipo de erro incide sobre dados não essenciais ao fato, ou erro na execução do tipo pretendido. Divide-se em erro sobre o objeto, erro sobre a pessoa e erro na execução.

Erro sobre o objeto (error in objecto)

Nesta hipótese de erro, o agente, tendo vontade e consciência de praticar uma conduta, equivoca-se em relação ao objeto a que se destina sua conduta. É o erro, por exemplo, de agente que deseja roubar um saco de açúcar e termina por roubar um saco de arroz.

 Erro sobre a pessoa (error in persona)

No erro sobre a pessoa, o sujeito, por uma imprecisa identificação da vítima, atinge pessoa diversa da pretendida. Como consequência, o agente responderá como se tivesse atingido a vítima intencionada, sujeito a agravantes e atenuantes do crime pretendido.

Art. 20, § 3º O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta da pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime.

Se o agente desejava matar o próprio pai e causa a morte de seu vizinho, por confundi-lo com aquele, responderá como se tivesse ocasionado a morte de seu pai, com o agravante adequado ao exemplo.

Erro na execução (aberratio ictus)

O agente identifica a vítima, mas, pela imprecisa realização do crime, pessoa diversa da pretendida é atingida. No aberratio ictus o erro ocorre de pessoa para pessoa.

Art. 73. Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste código.

Os requisitos do erro na execução são:

  • O agente falha completamente na execução;
  • O resultado se materializa da forma pretendida, porém, contra vítima distinta.

Se o agente acertou apenas pessoa diversa da pretendida, responderá como se tivesse atingido a pessoa pretendida, sujeito a agravantes e atenuantes do crime pretendido. No entanto, se atingir a vítima pretendida e vítima diversa, responderá pelos dois crimes: o que desejava, dolosamente, e o que não desejava, culposamente.

Assim, portanto, se o agente deseja matar Caio e, por erro na execução, acerta Mévio, responderá como se tivesse atingido Caio. Se, entretanto, atingir Caio e Mévio, responderá pelo homicídio doloso de Caio e pelo homicídio culposo de Mévio.

A doutrina e a jurisprudência apresentam ainda duas outras formas de erro, não previstas no Código Penal, que são: erro de delito e erro de causalidade.

 Erro de delito (aberratio criminis)

Neste caso, o agente deseja atingir um bem jurídico e atinge outro. É uma falha na terceira fase do inter ciminis. O erro, no aberratio criminis, ocorre de pessoa para coisa ou de coisa para pessoa.

Art. 74. Fora dos casos do artigo anterior, quando, por acidente ou erro na execução do crime, sobrevém resultado diverso do pretendido, o agente responde por culpa, se o fato é previsto como culposo; se ocorre também o resultado pretendido, aplica-se a regra do art. 70 deste código.

Tem-se como exemplo o agente que, desejando destruir uma vitrine, atira uma pedra contra ela e, por erro, não acerta a vitrine, mas uma pessoa. Nesta hipótese, responderá o agente pelo delito de lesões corporais de natureza culposa, ficando afastada a sua responsabilidade em relação à tentativa de dano.

O agente responderá por:

TENTATIVA DA FINALIDADE + RESULTADO CULPOSO

™Se o autor deseja danificar um objeto e atinge uma pessoa (aberratio criminis com resultado único), responderá pelo dano causado de forma culposa.

™Se o agente pretende ofender uma pessoa e atinge uma coisa (aberratio criminis com resultado único), não poderá ser responsabilizado pelo dano causado à coisa, pois não existe crime de dano culposo.

™Se deseja ofender uma pessoa e atinge esta e uma coisa (aberratio criminis com resultado duplo), subsiste o resultado sofrido pela vítima, pois não existe crime de dano culposo.

™Se o agente quer atingir uma coisa e atinge esta e uma pessoa (aberratio criminis com resultado duplo), existem dois delitos: dano (art. 163 do CP) e homicídio culposo ou lesão corporal culposa.

Erro de causalidade (aberratio causae)

Esta hipótese de erro acontece quando o resultado pretendido inicialmente pelo agente adveio de causa por ele não cogitada. A responsabilidade do agente, neste caso, será verificada através do “dolo geral”, ou seja, sua finalidade.

Por exemplo: o agente queria matar sua vítima afogada, e, para alcançar esse fim, decide amarrá-la em um saco e jogá-la em um rio, onde a vítima bate a cabeça em uma pedra e morre em decorrência desse trauma. A vítima não morreu pelo afogamento, mas, neste caso, o agente responderá por dolo geral, e será responsabilizado pelo homicídio doloso por afogamento.

 

Referências

Greco, Rogério. Curso de Direito Penal. 10ª. Vol. I. Rio de Janeiro: Impetus, 2008.

Jesus, Damásio E. de. SEDEP. s.d. http://www.sedep.com.br/?idcanal=24744 (acesso em 5 de Maio de 2014).

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